Mariana, 10 anos: reparação ambiental já custou bilhões, mas bacia do Rio Doce está mais pobre em biodiversidade

  • 04/11/2025
(Foto: Reprodução)
Mariana, 10 anos: bacia do Rio Doce está mais pobre em biodiversidade, dizem especialistas Desde que recebeu uma avalanche de rejeitos de mineração da barragem da Samarco, em Mariana, dez anos atrás, o Rio Doce mudou. A tragédia favoreceu o avanço de espécies exóticas, em detrimento das nativas, e a bacia ficou mais pobre em biodiversidade. Além disso, segundo especialistas, as ações de reparação ambiental executadas na última década não foram suficientes para reverter os danos. Pelo contrário, elas podem estar contribuindo para a perda de variedade da fauna e da flora nos locais afetados. Inicialmente, essas medidas ficaram a cargo da Fundação Renova, entidade criada e mantida pelas mineradoras – Samarco e acionistas, Vale e BHP. No entanto, com a assinatura de um novo acordo de reparação com o poder público, em 2024, a Renova foi extinta, e as ações ambientais passaram a ser responsabilidade da Samarco. O g1 publica nesta semana uma série especial sobre os 10 anos do rompimento da barragem da Samarco. Além de abordar em que resultaram os processos judiciais que tratam do caso, mostraremos como estão a recuperação da área atingida no Rio Doce, as famílias que sobreviveram e foram realocadas e a área tomada pela lama. Mariana, 10 anos: ninguém foi condenado por tragédia que matou 19 pessoas, destruiu comunidades e contaminou Rio Doce Fauna simplificada e invasão de espécies exóticas De acordo com Frederico Fernandes, biólogo pesquisador da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e um dos coordenadores da Rede Terra Água, a fauna de peixes ficou mais "simplificada" desde o desastre. Ele compara os efeitos que o rompimento da barragem causou no rio aos que uma floresta sofre quando é transformada em pastagem. "Simplifica-se o habitat, e várias espécies que existiam ali passam a não ocorrer mais. Depois do rompimento, o que aconteceu com o rio é que o rejeito simplificou o habitat, transformou o habitat que tinha pedras e areias em um habitat que só se tem um tipo de fundo, o fundo com sedimento", explicou. ✅Clique aqui para seguir o canal do g1 MG no WhatsApp Segundo o pesquisador, coletas realizadas em diferentes pontos da bacia identificaram a presença majoritária de espécies exóticas, ou seja, organismos de outras áreas que foram introduzidos na região, como piranhas-vermelhas e tucunarés. "O rompimento da barragem contribuiu para a introdução de espécies exóticas, a partir do momento que as espécies nativas da calha do Rio Doce morreram. As exóticas são competidoras mais resilientes e predam ovos e larvas de espécies nativas. Algumas espécies começam a desaparecer, e isso não tem como ser recuperado", disse. ✅Mande sua denúncia, reclamação ou sugestão para o g1 Minas e os telejornais da TV Globo O mesmo está acontecendo no solo. De acordo com Geraldo Fernandes, professor de Ecologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBio) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, estudos recentes identificaram que minhocas exóticas estão se espalhando rapidamente pelas áreas onde há depósito de rejeito. São espécies de outros locais do mundo, como Ásia e América Central, que acabam combatendo e eliminando as minhocas nativas. "Nós perdemos biodiversidade. [...] E a minhoca é um bicho muito importante, ela melhora as condições do solo, torna o solo menos compactado, degrada matéria orgânica e devolve nutrientes para as plantas crescerem", afirmou o professor. Mariana, 10 anos: o caminho da lama da barragem de Fundão Taxas de decomposição menores Pesquisas indicam também que as taxas de decomposição – processo em que folhas e animais mortos são transformados em material nutritivo para o solo – são muito menores nos ambientes contaminados por rejeito de mineração. "São menores porque está faltando vida no solo, faltando bactérias, fungos, e isso é muito sério, porque as plantas não se decompõem na mesma velocidade. Isso tem impactos profundos na dinâmica da floresta e prejudica produção de frutos para a fauna", explicou o professor Geraldo Fernandes. Segundo ele, a solução depende do plantio das espécies corretas, que possam fertilizar o solo adequadamente. Este, no entanto, tem sido outro problema. Reparação inadequada com 'homogeneização' De acordo com Geraldo Fernandes, as ações de reparação não têm levado em consideração a biodiversidade original da flora, e a vegetação que restou na bacia do Rio Doce já é "completamente diferente" da que existia antes. "Nós não temos uma floresta só desde Mariana até a foz do rio. Se temos vários tipos de florestas diferentes, isso significa que não posso restaurar tudo da mesma forma. [....] E o que tem sido feito é uma homogeneização, transformando o rio de cabo a rabo em uma coisa homogênea. Se deixarmos do jeito que está podemos ter vários problemas e chegar ao ponto de não retorno da vegetação. Isso tem um preço altíssimo", disse. Bote na foz do Rio Doce em Regência, no Espírito Santo, após localidade ser atingida por lama da barragem de rejeitos Ricardo Moraes/Reuters Para o professor da UFMG, é preciso repensar o processo de reparação ambiental. "As ações precisam considerar esse conhecimento ou vamos só fazer de conta que estamos restaurando o rio. Para ter água limpa é preciso ter uma floresta funcionando como uma fábrica de água limpa de forma correta. O retorno da biodiversidade, do funcionamento do Rio Doce, só vai acontecer de maneira mais eficaz se observarem esse conhecimento científico", falou. Na avaliação do pesquisador Frederico Fernandes, da UFV, a lentidão do processo de reparação também prejudica o alcance dos resultados esperados. "A gente esperava, dez anos atrás, quando houve o rompimento, que o rio hoje estivesse melhor do que está, e não foi possível. A demora é muito grande, e o tempo é uma coisa precisa nesse sentido de recuperação", afirmou. Fernandes defende a continuidade do monitoramento da concentração de metais nos peixes, a criação de uma unidade de conservação no rio e a melhora da qualidade da água, que passa pelo fim do despejo de esgoto não tratado na bacia do Rio Doce. Falta de esgotamento sanitário O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (órgão colegiado vinculado ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos), José Carlos Loss Júnior, também defende que investimentos em saneamento básico sejam prioridade na reparação. Segundo dados do Plano Integrado de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (PIRH), apenas 42 dos 211 municípios com sede na bacia têm ao menos 30% dos efluentes tratados em relação ao esgoto coletado. Além disso, somente 33% da população urbana da bacia do Rio Doce possui atendimento de esgotamento sanitário adequado. Para 58%, o serviço é precário, e 8% da população não é nem atendida. "O impacto do lançamento de efluentes é muito maior nos rios menores, esse é um ponto que precisa fazer com que aconteça de fato", disse José Carlos. Na avaliação dele, do ponto de vista de reparação da poluição causada no rio, "muito pouco" foi feito nesses dez anos. "A principal fonte de contaminação foi a lama de rejeito que caiu no rio. A retirada desse material não aconteceu, e hoje temos um efeito praticamente crônico. [...] Em períodos de cheia, a água extravasa, carreia esse material para as margens, e os municípios convivem com esse fantasma. Ainda temos muito o que fazer", afirmou. Mariana, 10 anos: ninguém foi condenado por tragédia que matou 19 e contaminou Rio Doce O que diz a Samarco Em nota, a Samarco afirmou que mais de R$ 68,4 bilhões foram investidos em diversas frentes de atuação, desde a tragédia, contemplando as ações ambientais. "Desde 2016, mais de 42 mil hectares foram cercados e protegidos, sendo que aproximadamente 31 mil hectares estão em processo de plantio ou enriquecimento com espécies nativas. Também foram cercadas e protegidas cerca de 3,9 mil nascentes". Com a assinatura do novo acordo de reparação e o fim da Fundação Renova, a mineradora ficou responsável pela recuperação ambiental da foz do Rio Doce e do litoral de Linhares. "A Samarco elaborou e submeteu às autoridades ambientais um plano robusto de recuperação, que orientará as próximas ações e investimentos necessários. Cada etapa será definida pelas autoridades, assegurando que os recursos sejam aplicados conforme as necessidades do plano", afirmou a empresa. Ainda segundo a Samarco, o monitoramento hídrico na bacia do rio Doce indica que "a qualidade da água apresenta parâmetros similares àqueles anteriores ao rompimento da barragem". Sobre o processo de reparação, a mineradora disse que mais de 200 espécies nativas são utilizadas, como jenipapo, ipê rosa e imbaúba. Elas foram selecionadas de acordo com o inventário florestal realizado na bacia do rio Doce. Há ainda uma rede de sementes, que envolve comunidades locais na coleta de sementes nativas para abastecer viveiros e plantios diretos. De acordo com a Samarco, UFMG e UFV são parceiras no processo de reparação ambiental. "O Novo Acordo estabelece indicadores ecológicos para avaliar a efetividade da recuperação ambiental das áreas atingidas, tais como a riqueza de espécies nativas, densidade de regenerantes nativos e cobertura do solo. Atualmente estão em processo de recuperação ambiental mais de 230 hectares, nos municípios de Mariana, Barra Longa, Ponte Nova, Santa Cruz do Escalvado e Rio Doce", afirmou a empresa. Relembre a tragédia Números da tragédia da Samarco em Mariana Arte/ g1

FONTE: https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2025/11/04/mariana-10-anos-reparacao-ambiental-perda-biodiversidade.ghtml


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